Numa pacata cidade do interior, longe dos holofotes e do burburinho das grandes capitais, um restaurante tornou-se lenda viva. "À Sombra da Lua" era sinônimo de alta gastronomia, frequentado por quem buscava sabores únicos e experiências sensoriais à mesa. Com funcionamento restrito às noites — apenas a partir das 22h —, o estabelecimento era comandado por um chef enigmático, conhecido apenas como Sr. Antoine.
Ninguém sabia muito sobre ele. Solitário, reservado e invisível fora da cozinha, o chef se mantinha afastado dos clientes, deixando o salão nas mãos de garçons de fala contida e semblantes inexpressivos. As especialidades da casa, descritas como “surpresas da noite”, não apareciam em nenhum cardápio. Os pratos vinham prontos da cozinha, impecáveis, aromáticos e sempre elogiados por sua originalidade.
Mas havia algo estranho no ar. As luzes eram sempre baixas demais. O ambiente, silencioso e opressor. E a ausência total de informações sobre o chef ou sobre a origem dos ingredientes despertava murmúrios e lendas entre os moradores.
Foi esse clima de mistério que levou Clara, uma jovem jornalista em busca de uma grande história, até o restaurante. Intrigada pelos relatos e pelas superstições locais — que falavam de desaparecimentos e de um chef que jamais saía do restaurante —, ela decidiu investigar.
Clara fez uma reserva e levou consigo uma pequena câmera. Durante o jantar, fingiu um passeio ao banheiro e seguiu discretamente em direção à cozinha. O que encontrou por trás da porta a deixou em choque: uma cozinha estéril e organizada, mas com uma enorme mesa de mármore onde repousavam pedaços de carne que desafiavam qualquer identificação comum.
Ali estava ele. Sr. Antoine. Alto, magro, com olhos vazios e um avental salpicado de sangue. Ele manuseava a carne com uma precisão quase ritualística. Quando percebeu a presença da jornalista, não demonstrou surpresa. Apenas se virou lentamente, com um sorriso cortante, e pronunciou palavras que gelaram Clara até os ossos:
— Está se escondendo para ver o quê?
Antes que pudesse fugir, dois garçons surgiram das sombras e a arrastaram de volta ao salão. As suspeitas de Clara se confirmaram: o restaurante servia carne humana. A curiosidade havia selado seu destino.
Dias se passaram. Clara desapareceu sem deixar vestígios. A cidade murmurava, mas ninguém agia. O restaurante continuava abrindo suas portas todas as noites, e novos clientes continuavam a chegar. A reputação da casa permanecia intacta — alimentada, talvez, pelo silêncio cúmplice de quem preferia não enxergar o que se escondia nas sombras.
Porque ali, à meia-luz e sob o comando do Chef da Noite, o preço da curiosidade podia ser fatal.
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