A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) está ampliando seu cerco contra o comércio de produtos não homologados vendidos em marketplaces como Amazon, Mercado Livre, Shopee, AliExpress e Shein. A medida vem na esteira de sucessivas operações que visam proteger os consumidores brasileiros de riscos e também combater a concorrência desleal causada pela comercialização de itens irregulares.
A proposta, que vem sendo debatida com mais força nos últimos meses, inclui a possibilidade de aplicar sanções severas às plataformas digitais, incluindo bloqueios temporários ou até definitivos de seus serviços no Brasil. Segundo a Anatel, esses marketplaces permitem a venda de milhares de produtos de telecomunicações que não passam por nenhum processo de certificação obrigatória, colocando em risco a segurança dos consumidores e infringindo a legislação brasileira.
Entre os principais alvos estão dispositivos como carregadores, roteadores, antenas, repetidores de sinal, celulares, fones de ouvido sem fio e até aparelhos eletrônicos diversos que, sem homologação, podem oferecer riscos de curto-circuito, incêndios e até interferências na rede nacional de telecomunicações.
Somente em 2023, a Anatel removeu mais de 1,4 milhão de anúncios de produtos não homologados em plataformas digitais. Em paralelo, apreendeu cerca de 50 mil itens ilegais em operações físicas realizadas em depósitos e centros de distribuição por todo o Brasil.
A grande mudança proposta agora é transferir parte da responsabilidade pelas vendas irregulares das mãos dos vendedores para as próprias plataformas. Até então, Amazon, Mercado Livre, Shopee e outras argumentavam que apenas intermediam as vendas entre vendedores e consumidores. Porém, segundo a Anatel, essa justificativa não isenta as empresas de garantir que os produtos anunciados estejam dentro da legalidade.
A Anatel defende que, assim como qualquer comércio físico é obrigado a respeitar as normas nacionais, os marketplaces digitais também devem seguir a mesma lógica. O órgão regulador já notificou oficialmente as empresas e está em diálogo com outras entidades, como Receita Federal, Ministério da Justiça, Procon e Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), para alinhar medidas conjuntas.
O anúncio provocou reação imediata das plataformas, que alegam estar colaborando para remover anúncios irregulares, mas destacam a dificuldade de controlar milhões de vendedores. As empresas afirmam que estão investindo em ferramentas de inteligência artificial e reforçando suas equipes de fiscalização interna.
Entretanto, caso a Anatel avance com a proposta de bloqueio, o impacto no comércio eletrônico brasileiro seria gigantesco. Segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), marketplaces respondem por cerca de 78% de todas as vendas online no país. Além disso, milhares de pequenos empreendedores que dependem dessas plataformas seriam diretamente afetados.
A possibilidade de bloqueio também levanta questões diplomáticas e jurídicas. Grandes empresas como Amazon, Shopee e AliExpress são multinacionais com sedes fora do Brasil, e qualquer sanção pode gerar repercussões internacionais, além de disputas judiciais longas e complexas.
No Congresso Nacional, parlamentares já começaram a discutir projetos de lei que possam regulamentar de forma mais clara a responsabilidade dos marketplaces. Existe uma divisão: enquanto parte dos deputados defende regras mais duras para proteger o consumidor e a indústria nacional, outro grupo teme que o endurecimento excessivo prejudique a economia digital, a geração de empregos e o acesso dos brasileiros a produtos mais baratos.
Nas redes sociais, o assunto gerou uma enxurrada de comentários. Muitos consumidores se mostram favoráveis à fiscalização para garantir segurança e qualidade dos produtos. Por outro lado, há uma parcela considerável que teme que essas medidas levem ao aumento dos preços e à redução da variedade de ofertas no mercado.
A Anatel sinaliza que a intenção não é prejudicar o comércio eletrônico, mas sim estabelecer regras claras e justas. A expectativa é que as plataformas criem mecanismos mais robustos de controle, como exigir certificações antes da publicação de anúncios de determinados produtos.
Caso as empresas se adequem, o risco de bloqueio diminui. Porém, se persistirem as infrações, o órgão regulador afirma que não hesitará em aplicar as sanções previstas.
O embate entre a Anatel e os gigantes do e-commerce no Brasil marca um momento decisivo para o futuro das compras online no país. A busca por equilíbrio entre proteção do consumidor, respeito às leis e incentivo ao mercado digital será fundamental para definir os próximos passos. Até lá, consumidores, vendedores e as próprias plataformas acompanham com atenção o desenrolar dos acontecimentos.
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