O Hospital Couto Maia, originalmente fundado em 9 de abril de 1853 pelo presidente da província, João Maurício Wanderley, foi criado no Alto de Mont‑Serrat, em Salvador, para tratar marinheiros com febre amarela vindos dos navios que aportavam no porto da cidade . Munido de práticas pioneiras, como o uso de plantas medicinais e técnicas de isolamento, tornou‑se um marco da medicina sanitária no Brasil do século XIX.
Inicialmente batizado de Hospício dos Bentos e, posteriormente, Hospital de Mont‑Serrat, apenas em 1936 passou a homenagear o médico Augusto Couto Maia, diretor por mais de três décadas, por sua atuação no combate às epidemias e na formação acadêmica na Bahia.
Durante o século XX, o Couto Maia consolidou‑se como centro de tratamento e pesquisa em doenças infectocontagiosas. Assim, abrigou um verdadeiro polo de ensino e serviço em bacteriologia, destacando‑se na medicina e na vigilância à saúde pública baiana.
Com o passar das décadas, a estrutura física original tornou‑se obsoleta — sem condições de expansão ou modernização. Em 2018, o antigo prédio no Mont‑Serrat foi desativado e a unidade foi transferida para Águas Claras, onde nasceu o Instituto Couto Maia (ICOM), fruto da fusão com o Hospital Dom Rodrigo de Menezes, especializado no tratamento da hanseníase.
O novo ICOM — uma moderna unidade com cerca de 130 leitos, incluindo UTIs, ambulatórios de infecção geral, HIV e neuroinfecções — foi planejado para oferecer atendimento humanizado e tecnológico às doenças infectocontagiosas e parasitárias, integrando ensino e pesquisa em saúde.
Entretanto, o antigo prédio no Mont‑Serrat não ficou abandonado. Em 2019 foi anunciado que o local seria transformado no primeiro hospital de grande porte do SUS dedicado exclusivamente a cuidados paliativos . As obras de restauro do prédio histórico de 1856 iniciaram‑se no segundo semestre para criar o “Hospital Mont‑Serrat – Cuidados Paliativos”, com cerca de 69 leitos, incluindo dez com ventilação crônica, atuando como coordenador estadual do programa de paliação.
Cuidados paliativos não significam abandono. Trata‑se de uma abordagem integrada e multidisciplinar — com médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas, nutricionistas e até apoio espiritual — voltada para o controle de sintomas, conforto e qualidade de vida de pacientes em estágio terminal, com expectativa de vida inferior a seis meses.
Esses cuidados têm origem no século XX, mas só nos anos recentes ganharam força no Brasil. O foco é aliviar dor, angústia emocional, social e espiritual. O modelo internacional reforça que estes cuidados devem acompanhar, e não substituir, tratamentos curativos, promovendo dignidade até o fim.
O Hospital Mont‑Serrat não contará com UTI nem emergências tradicionais. Sua missão é oferecer suporte contínuo e acolhedor — institucionalizar práticas de fim de vida que garantam conforto, autonomia e dignidade, sem recursos para reanimações ou internações intensivas.
Assim, o antigo Couto Maia renasce com novo propósito: de bastião contra epidemias para símbolo de compaixão no fim da vida. A restauração do prédio histórico preserva seu legado arquitetônico e científico, ao passo que os cuidados paliativos representam um avanço humanitário no SUS .
Nosso país dá um passo importante na saúde pública: criar um modelo de atenção terminal que não foca em prolongar a vida a qualquer custo, mas em mantê‑la digna até o último instante. Um hospital sem UTIs, sem sirenes de emergência – porém repleto de cuidado, empatia e respeito.
A transformação do antigo Couto Maia em hospital de cuidados paliativos resgata a missão histórica da unidade: cuidar dos doentes mais vulneráveis — antes infectados pela febre amarela, hoje acometidos por doenças terminais — encerrando seu ciclo na nobre arte de acolher a fragilidade humana.
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